
Diante da recente controvérsia sobre a declaração do Exmo. Sr. presidente da República, que se utilizou da expressão “paraíba” como forma de dirigir-se aos nordestinos, o blog relembra outra polêmica, desta feita no esporte e ocorrida aqui em Natal.
Em 1997, um clube do Rio Grande do Norte voltou à elite do futebol brasileiro. Após conseguir o acesso a Série A do campeonato nacional no ano anterior, o América estava outra vez na principal competição e entre os grandes clubes do país.
A equipe rubra teve uma honrosa participação, ficando em 16º lugar, com 7 vitórias, 9 empates e 9 derrotas. O Machadão transformou-se no caldeirão americano, endurecendo as partidas contra os tradicionais adversários, sucumbindo a única derrota em casa na derradeira partida, contra o São Paulo (1x3 em 02.11.1997).
Não precisa ser torcedor fanático do América para lembrar, na ponta da língua, a base daquele belo time de futebol, que disputou o Brasileirão/1997. Emerson, Dinho, Marcelo Fernandes, Gito e Denys; Moisés, Carioca, Moura e Biro-Biro; Gian e Richardson, tendo como técnico Júlio Cesar Leal.
De todas as partidas jogadas no Machadão, talvez a mais emblemática tenha sido contra o Vasco da Gama/RJ, válida pela 13ª rodada. O Vasco de Carlos Germano, Mauro Galvão, Juninho Pernambucano, Evair e Edmundo e que seria o campeão brasileiro daquele ano.
Naquele dia, o time potiguar promovia a estreia de Marcelo Fernandes, que veio do Santos/SP, na zaga, substituindo Nelson. Marcelo entrou para tomar conta da camisa 3 e não mais sair do time.
Logo aos 2 minutos de jogo, Edmundo cometeu uma falta por trás em Gian e recebeu o primeiro cartão amarelo. No segundo tempo, tratou de puxar a camisa do volante Moisés, recebendo o segundo cartão e, consequentemente, sendo expulso do jogo.
Então a polêmica. Em sua saída de campo, o jogador fez a seguinte declaração:
“a gente vem na Paraíba, um ‘paraíba’ apita, só pode prejudicar a gente”.
Além do desconhecimento geográfico, a ira do “animal” era direcionada ao árbitro cearense Dacildo Mourão, conhecido pela distribuição de cartões amarelos nas partidas que apitava. Nos vestiários, utilizando de argumentos culturais, tentou justificar alegando que o nordestino é chamado de “paraíba” no Rio de Janeiro.
A declaração rendeu ao jogador processos judiciais, um deles uma representação criminal pela prática de racismo proposta pelo jornalista paraibano Sebastião Barbosa de Souza. A promotoria de justiça criminal da Paraíba declinou da competência em face do delito ter ocorrido em Natal/RN, remetendo os autos à Comarca desta Capital. Aqui o processo foi arquivado, em face da decadência ocorrida.
O outro processo foi uma ação de indenização por danos morais, apresentada pelo mesmo jornalista, que apesar de ter sido julgada procedente no juízo de primeiro grau, foi reformada a sentença pelo TJ/PB, tendo o relator entendido que “as ofensas não foram dirigidas ao jornalista, mas ao árbitro de futebol”.
Na outra Justiça, a desportiva, embora estivesse passível de pegar 11 partidas de suspensão, conforme denúncia da procuradoria, o jogador foi absolvido pelo Tribunal Especial da CBF, pagando uma multa de R$ 75,00 (setenta e cinco reais). Edmundo entrou instigado no jogo seguinte, após o julgamento. Sem falar com a imprensa, descontou sua ira animal contra o União São João de Araras, marcando todos os seis gols na vitória de 6x0, um recorde até então imbatível em campeonatos brasileiros.
O jogo entre o América e o Vasco terminou sem abertura de contagem, e ficou na história e no folclore do futebol nacional, tendo o Jornal do Brasil publicado, em 22.08.1997, a charge que ilustra este post.
FICHA TÉCNICA
AMÉRICA 0x0 VASCO
Data: 20-08-1997
Local: Machadão
Público: 26354
Renda: 265.850,00 (duzentos e sessenta e cinco mil, oitocentos e cinquenta reais)
Árbitro: Dacildo Mourão/CE
Auxiliares: Arnaldo Pinto Filho/BA e Ricardo Menezes/PE
AMÉRICA: Emerson; Dinho, Marcelo Fernandes, Gito e Denys; Moisés, Carioca, Moura e Richardson; Gian (Biro-Biro) e Raudnei (Agnaldo). Técnico: Júlio Cesar Leal
VASCO: Márcio; Maricá (Felipe), Odvan, Mauro Galvão e Cesar Prates; Luisinho, Walber, Ramon e Pedrinho (Mauricinho), Edmundo e Evair (Marcelo). Técnico: Antonio Lopes