A ética da política

03 de Outubro 2019 - 21h11
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Revistas, jornais, sites, rádios, TVs criticam a maneira como alguns partidos políticos atuam no Congresso Nacional.

As críticas são dirigidas principalmente ao clientelismo e ao fisiologismo das agremiações partidárias.

É da natureza dos partidos brigarem por espaços. Em outras palavras, o instinto de lutar pelo poder está no DNA deles.

Partidos políticos só têm poder por meio dos espaços que controlam no aparelho do Estado. E isso significa cargos, de preferência importantes, que controlem verbas substanciais, que elaborem e toquem grandes projetos, etc.

Num regime político como o brasileiro, em que o presidente precisa constantemente negociar, o jogo, por envolver um grande número de partidos, muitos deles fracionados, é predatório.

Os que saem derrotados das urnas, que perdem redutos políticos, precisam, para sobreviver, de muita astúcia, para impedir que não haja uma caça generalizada aos seus quadros.

Nicolau Maquiavel mostrou no início do século XVI uma reavaliação das relações entre ética e política.

O pensador florentino apresentou uma moral secular de base naturalista e estabeleceu a autonomia da Política, rejeitando a anterioridade das questões morais na avaliação política.

A ética maquiaveliana analisa as ações em função dos resultados da ação política; o que é moral é o que traz o bem à sociedade, sendo necessário e legítimo, às vezes, fazer o mal.

Segundo Maquiavel, se o governante aplicar de forma inflexível os padrões morais que regem a sua vida pessoal à vida política, não conseguirá governar eficientemente.

Por isso, a avaliação moral não pode e não deve ser feita antes da ação política, conforme normais gerais e abstratas, mas sempre a partir de um contexto bem específico, porquanto toda ação política dirigir-se à sobrevivência do grupo.

Enquanto os filósofos antigos e medievais procuravam descrever o bom governo, estabelecendo regras inflexíveis que moldassem o perfil do governante ideal, Maquiavel demonstrava cruamente como de fato os governantes procedem. 

Governos precisam aprovar projetos e propostas. Para tal, precisam estabelecer uma base de sustentação ou de apoio para passá-los no Congresso Nacional.

Assim, praticamente tudo o que ocorre com os agrupamentos da base governista é, de certa forma, responsabilidade do governo.

São os recursos, financeiros inclusive, de que dispõe na Presidência da República, aliados à sua capacidade de negociação e convencimento, que poderão permitir um melhor encaminhamento das pretensões governamentais.

O bom governante é aquele capaz de compreender o jogo político real e suas circunstâncias concretas, identificando as forças em conflito a fim de agir com eficácia; os valores morais que regulam as condutas individuais não se aplicam à ação política – atividade que envolve o destino não de um cidadão, mas de toda a comunidade/sociedade.

Desta forma, o Presidente pode e deve atuar como árbitro do jogo político.

Distribuir cargos e verbas sempre foi e continuará sendo um dos elementos primordiais do funcionamento de uma coalizão.

Os partidos políticos que formam uma coalizão querem ter o maior número possível de cargos sob o seu comando e lutam para manter a coalizão com o menor número possível de partidos. Por isso, a lógica e a dinâmica dos governos de coalizão são, por vezes, brigas intestinas, lutas por espaços.

Convém, entretanto, não conduzir as negociações políticas de forma atabalhoada e amadora; elas devem ser efetivadas em torno de um projeto de construção nacional.

As negociações que eliminem os partidos do jogo político e façam ligação direta com os movimentos sociais não são boas para o fortalecimento da democracia, pois constituem portas abertas para o fortalecimento desmedido do poder Executivo.

As ditaduras começam assim.