A persistência da retórica sebástica

15 de Novembro 2021 - 05h50
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Estamos no final de 2021, a quase um ano da eleição presidencial, mas os potenciais candidatos insistem em adiantar a campanha e esquecerem que o Brasil (e quase todo o mundo) precisa de unidade para sair da crise na qual está mergulhado.

O presidente da república e candidato a renovar o mandato e o ex-presidente Lula, os principais contendores, parece que ainda não perceberam que a campanha política pode esperar um pouco mais. A linguagem de comícios insiste em dominar a fala deles e, de resto, de todos os que se apresentam como salvadores da pátria.

Deveria ser hora de mais administração e menos eleitoralismo. Mais ações e menos marketing.

É usual entre os políticos brasileiros não perceberem a distância que separa o palanque do gabinete. Mas no caso de Bolsonaro e de Lula é patológico e o resultado tem sido catastrófico para o país, engolfado por crise que parece não ter fim.

O imobilismo político e administrativo do atual presidente e sua potencial sanha gastadora, geram desconfianças no mercado, pois demonstram que as preocupações do atual ocupante do Palácio do Planalto são mais pela reeleição e menos pela saúde financeira do Estado.

Enquanto isso, ex-presidente Lula sobe nos palanques e nas pesquisas acreditando-se empenhado numa cruzada política destinada a acabar com o sofrimento dos pobres a toque de exibição e falação, adotando retórica salvacionista que, sabemos, invariavelmente resulta em demagogia desenfreada, irresponsabilidade financeira e ressaca fiscal, com todas as consequências deletérias.

Bolsonaro não fica atrás.

Lula e Bolsonaro jogaram o Brasil num extremismo desastroso e apresentam-se como os escolhidos para retirá-lo de lá. Um “salvando” à esquerda e o outro, à direita. Ambos, metendo a mão no combalido cofre estatal.

Sempre que podem Bolsonaro e Lula recorrem à retórica demagógica. Um e outro apresentam-se como o bonzinho que vai combater o mal, personalizado no adversário, qualquer adversário que se ponha no caminho. Hoje, o mal, para Bolsonaro, está em Lula; o de Lula, em Bolsonaro. Ambos estão prontos para salvar a população brasileira das garras dos que só se aproveitam dela.

É um discurso perigoso porque marginaliza a política, a sociedade, as questões econômicas, a razão, etc. Política e fé se fundem e, juntas, propõem a salvação a qualquer custo.

Bolsonaro e Lula não são os primeiros a fazerem uso de tais expedientes. Por sinal, a retórica messiânica não soa esquisito em líderes como eles, nascidos nos laboratórios do populismo tupiniquim, acalentados no assistencialismo rasteiro e apoiados pelo tradicionalismo político. É da essência dos dois contendores. Sem ela, o ex e o atual presidente não existiriam politicamente.

Não é novidadeira no Brasil, como disse acima, a apropriação do discurso religioso pelo debate político. Até os anos 1970, os anticomunistas acusavam os comunistas de representarem o mal, e estes diziam ser a burguesia e os latifundiários as melhores representações de vilania.

A retórica política sebástica é, além de pretensiosa, absurdamente cínica, pois invoca o sagrado para defender interesses comuns e materiais.

O povo, ora o povo é apenas joguete da inconfessabilidade política.