A violência, os games, os desenhos animados

29 de Setembro 2019 - 08h49
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Participei há duas semanas de um evento promovido por uma escola em Natal.

O tema que a escola vem trabalhando com os seus alunos é “Cultura da Paz”.

Um dos debatedores apontou a violência literal e simbólica presente no desenho animado Pica-Pau para contrapor à cultura da paz dos grupos indígenas que habitavam a América antes e durante o processo de conquista empreendido pelos europeus.

Não vou entrar no mérito da discussão guerra dos europeus versus paz do indígenas, pois não é o propósito aqui.

Tenho cinquenta e dois anos de idade e quase 30 como professor e acompanho, desde a minha adolescência, a paixão que os games e os desenhos animados despertam em crianças, jovens e também em adultos.

Eu mesmo sou louco por desenhos animados. Os da antiga, ressalto.

Zé Colmeia e Catatau, os Flintstones, Pepe Legal, Pernalonga, A Pantera Cor de Rosa, Peter Potamus e Tico Mico, entre outros, embalaram a minha infância e minha adolescência.

Vez por outra, volto a assisti-los. Mostro-os aos meus filhos.

Nunca fui fã de games, mas os meus dois filhos mais velhos gostam muito e tenho amigos que são vidrados.

É difícil ver um adolescente ou um jovem adulto que não seja apaixonado por games, como é difícil ver alguém de minha geração ou das anteriores que não sintam saudades dos desenhos animados que citei acima.

Desde que os jogos eletrônicos começaram a se popularizar, ali pelo início dos anos 1980, a difusão foi rápida.

Com o tempo, pais e alguns especialistas passaram a disseminar a ideia de que as crianças estavam como que hipnotizadas pelos joguinhos cada vez mais sofisticados.

A Internet, nascida para fins científicos e militares, passou a ser utilizada para o lazer, aí incluindo-se os games. E isso fez tocar o alarme, pois a tal hipnose agora ocorreria em escala planetária, com todas as crianças do mundo plugadas o tempo todo e envolvidas pelo mundinho e desconectadas da vida real.

Logo surgiram as acusações de que as crianças passam tempo demais jogando videogame e isso prejudica o desenvolvimento delas, que os jogos são alienadores e, a cereja no bolo, que a violência dos jogos desencadeia um tsunami de agressividade em crianças, adolescentes e jovens.

Basta aparecer um lunático chacinando colegas de escola ou desconhecidos no cinema, no shopping ou na rua para que a imprensa descubra algum especialista apontando o efeito nocivo que filmes, desenhos animados e games têm sobre a mente de crianças e adolescentes.

Quando uma pessoa tem um surto de psicose e ele vem acompanhado de violência, mesmo o “inocente” Tom e Jerry pode ser responsabilizado, visto que ali há certa dose de perversão.

A crueldade de Jerry era – e ainda é – motivo de risos. Como o é também a de Pernalonga, Pica-Pau, etc.

A geração que ria e ri de Tom e Jerry, Pernalonga e Pica-Pau é pai da geração dos games, neta de vovôs que vibravam com os filmes de faroeste em preto e branco nos quais índios descritos como vilões partiam o crânio de colonos brancos e eram chacinados, aos montes, a tiros de carabinas e revólveres, e filha de pais que vibravam sobre a mesma temática dos faroeste, só que agora em filmes coloridos.

Ficar buscando bodes expiatórios para o mau comportamento da geração atual é apenas um escape para não assumir a verdadeira responsabilidade que cabe a pais e mães, a saber, conhecerem e conviverem com seus filhos, dando-lhes carinho e afeto.  

O resto é conversa para boi dormir.