'Com vírus descontrolado, Brasil não terá investimento', diz economista

04 de Agosto 2020 - 08h19
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Professora da Universidade Johns Hopkins, em Washington, Monica de Bolle avalia que os resultados econômicos pelo mundo começam a mostrar que é falsa a dicotomia entre salvar vidas ou a economia.

Países que controlaram melhor a pandemia, como os europeus, estão se saindo melhor que EUA, Brasil ou o México. E a incerteza não afeta apenas comércio e serviços neste momento, tende a piorar o investimento e as contas públicas.

Já é possível dizer que os países que controlaram melhor a pandemia estão em melhor situação econômica?

Com os dados do segundo trimestre de 2020 vimos que, no período, tanto os países europeus como os Estados Unidos tiveram quedas muito expressivas. Os resultados foram praticamente iguais, por exemplo, olhando a queda do PIB da Alemanha ou dos Estados Unidos.

Mas o que diferencia a Alemanha dos EUA, olhando dois países maduros, é que na Alemanha a situação hoje está sob controle e a vida está voltando ao normal há algum tempo. Nos EUA, como a epidemia continua em expansão e fora de controle, a gente vai ver efeitos ainda muito pronunciados na economia.

O terceiro trimestre irá refletir esta diferença?

Sim. Temos que levar em conta que a Europa, nesta época, pode ser muito afetada pela redução da atividade do turismo, há uma questão sazonal importante. Mas há indicadores na Europa, de uma maneira geral, mostrando esta retomada. Nos EUA já está sendo discutido um novo pacote fiscal, o terceiro. Na Europa ninguém está fazendo isso.

Nos EUA os pedidos de seguro-desemprego voltaram a crescer. E há outro problema: seguro-desemprego é por pouco tempo, o governo tinha feito um ajuste para pagar um adicional de US$ 600 semanais até o fim de julho, isso acabou, e agora há 30 milhões de desempregados que vão parar de receber estes cheques.

Há uma disputa política pela prorrogação deste seguro-desemprego. Os pequenos negócios estão reabrindo, mas as vendas não estão bem. Se os EUA tivessem feito um lockdown mais consistente, com regras e comunicação claras, talvez estivesse reabrindo como na Europa.

E os outros países?

A China é um caso à parte, por ser o primeiro país afetado, tem uma capacidade de fazer medidas como testes em massa, rastreamento de casos, isolamento total, controlar a circulação da população que nenhum outro país tem. Não é replicável em outros países. Mas Nova Zelândia, Vietnã, Coreia do Sul, países menores cuja atuação foi muito determinada para controlar rápido a epidemia, logo em seguida começaram a retomar a economia.

E em países de renda baixa?

É a mesma situação. Se olharmos para a América Latina, há países que conseguiram fazer algum controle da epidemia. Além do Uruguai e da Costa Rica, que são países pequenos, há a Colômbia e o Chile, por exemplo, que fizeram algum controle da epidemia, muito maior que o Brasil ou o México. E a economia nesses países tende a reagir muito melhor que no Brasil, pois é possível reabrir de forma mais consistente, sem a incerteza enorme.

Isso afeta os investimentos?

No comércio e nos serviços isso é evidente. Mas, ao olharmos os dados mais macroeconômicos, a incerteza leva ao fim dos investimentos. Países como o Brasil não terão investimento, enquanto os países com controle do vírus terão algum investimento. O descontrole com o vírus afeta a capacidade de recuperação futura.

O Globo