Ou vota ou está demitido

19 de Outubro 2024 - 08h07
Créditos: Montagem Internet

Por Sérgio Trindade

 

A grande polêmica nesta reta final da campanha para a prefeitura de Natal é a atuação do diretor-técnico da Agência Reguladora de Natal (Arsban), Victor Diógenes, constrangendo servidores terceirizados e comissionados, exigindo que votem em Paulinho Freire, candidato apoiado pelo prefeito Álvaro Dias, conforme denúncia enviada ao Ministério Público do Trabalho (MPT) e matéria publicada na CNN Brasil. (https://www.cnnbrasil.com.br/eleicoes/diretor-de-agencia-reguladora-de-natal-cobra-nvoto-de-funcionarios-e-acaba-exonerado-do-cargo/).

Internautas ficaram em polvorosa e cobram providências do prefeito Álvaro Dias, cunhado de Victor Diógenes, e passaram a exigir que a Tribuna do Norte publicasse sobre o ocorrido, sem se darem conta que a medida que competia ao prefeito foi tomada (demissão do diretor) e que o jornal de propriedade do suplente de Rogério Marinho e apoiador do candidato Paulinho Freire publicou texto sobre o assunto (https://tribunadonorte.com.br/eleicoes-2024/diretor-da-arsban-cobra-voto-de-funcionarios-para-paulinho-e-e-exonerado/).

A prática – ilegal, frisemos – do ex-diretor-técnico da Arsban é corriqueira, de forma aberta ou velada, na política brasileira, nas esferas municipal, estadual e federal.

Todos, incluindo Natália Bonavides e seus eleitores, creem sinceramente que Álvaro Dias nomearia e manteria comissionados simpáticos à candidatura da petista? A petista nomearia adversários para cargos comissionados? Alguém do seu gabinete é eleitor de Paulinho Freire? Se fosse, seria mantido?

Testemunhei, em 2010, um caso, quando estava numa diretoria do IFRN na cidade de Santa Cruz, semelhante. Dilma Rousseff e José Serra disputavam o segundo turno da eleição presidencial e o tucano começou a ameaçar seriamente a vitória da petista. O PT enviou ao IFRN um emissário para conversar com os terceirizados e solicitou espaço ao professor Erivan Amaral, diretor do campus Santa Cruz, que, em férias, mandou-me mensagem para acompanhar a reunião do emissário do partido do governo com os servidores. A conversa não foi exatamente um assédio, mas uma “tentativa de convencimento”. Logo que percebi para onde se encaminhava, adiantei-me e falei que o espaço não era o adequado, tendo em vista ser uma repartição pública, mas que o nobre colega poderia conversar com todos fora dos muros da escola.

Um amigo de quase cinco décadas e funcionário há quase trinta anos do poder público municipal em Natal, disse-me que “a denúncia é verdadeira. É prática que se repete em toda eleição. Conheço cargos comissionados e terceirizados (afilhados de políticos), que saem de casa para trabalhar às 7h e só voltam lá pelas 22h. Tenho pena dessas pessoas, mas muitos até brigam para garantir seu emprego por mais 4 anos. Os marinheiros de primeira viagem são os que estão revoltados com esse assédio. Os que estão denunciando são aqueles que votaram em vereador que não se elegeu e sabem que ano quem voam da prefeitura”.

Uma autoridade no assunto, que já exerceu funções em escalão alto e intermediário nas três esferas do setor público, disse que “o comissionado é obrigado a fazer de tudo para manter o cargo. É a realidade”.

Não é incomum a mídia de massa veicular notícias de suspeitas e mesmo de fatos que demonstram o uso do poder púbico em benefício de interesses privados. É problema secular no Brasil e se constitui num dos problemas centrais do Estado brasileiro.

O Brasil precisa de várias reformas estruturais, entre as quais a administrativa, diminuindo o poder dos partidos políticos e de seus chefes e chefetes. Ela é adiada há pelo menos quatro décadas, e o Brasil segue com uma infinidade de cargos comissionados de livre nomeação, para deleite de políticos e de seus afilhados. E a cada eleição denúncia como a que agora veio a público se repetem.