Mudamos para não mudarmos

11 de Abril 2022 - 16h29
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O Brasil é mesmo um país sui-generis. Muda, muda e nunca muda.

Vejamos.

Por aqui foi dado um golpe de Estado que derruba todas as teses acadêmicas sobre golpes de Estado.

Tudo foi feito às claras, com cobertura de toda a mídia, transmitido pela televisão, com a chefe de Estado e de Governo golpeada tendo direito à defesa, junto a uma comissão de um dos poderes da República, feita por advogado pago pelo Estado que, segundo os seus aliados, golpeava-a (o Estado, não o advogado), num rito estabelecido por um dos poderes da República.

Tantos dizem e disseram por tanto tempo que foi um golpe de Estado, que parece, para eles e para muitos, verdade. Ainda mais quando, dois anos após a queda da presidente – ungida pela primeira vez ao cargo, em 2010, como executiva de escol e reeleita, em 2014, num pleito duríssimo –, sentou na cadeira presidencial um deputado federal do baixo clero, odiado por praticamente toda a intelligentsia brasileira.

A turma da executiva e de seu patrocinador e o pessoal do capitão duelam pelo voto do eleitor brasileiro neste 2022 e as facções mais extremadas dos dois lados quase nada devem uma a outra, quando o assunto é seguir de forma acrítica. Cegam para os pecados dos seus lideres e maldizem qualquer um que se ponha a apontá-los.

Testemunhamos, de 2013 até os dias que seguem, no Brasil, a história em movimento frenético, como às vezes a história caminha, aos saltos, sem prestar contas ao tempo que é sua morada. Césares ultrapassam (ou vivem querendo ultrapassar) o Rubicão, para usar imagem do historiador Arnold Toynbee. No Brasil, passam em movimentos circulares, fazendo a roda do tempo carregar a história para os mesmos pontos, como se negasse a máxima do alemão Karl Marx, para quem a história só se repete como farsa.

Sou simples professor de História, sem maiores luzes e sem qualquer pretensão acadêmica superior, mas insisto em dizer a meus alunos: vacinem-se contra a desinformação. Leiam. Formem o juízo de vocês. Não sejam seguidores cegos e alucinados de ideia alguma e menos ainda de pessoas. Não venerem nada e ninguém.

Há uma passagem n'O Anticristo, de Nietzsche, fantástica.  Nela, o filósofo alemão analisa a crença cristã, mas podemos, por analogia, estendermos a sua análise a qualquer crença, inclusive a política. Diz ele que “a necessidade de crença” é uma “necessidade de fraqueza”, pois o crente “não se pertence, só pode ser meio, tem de ser consumido, necessita de quem o consuma”, razão pela qual “não está livre para ter em geral uma consciência para a questão ‘verdadeiro’ e ‘não-verdadeiro’: ser honesto nesse ponto seria desde logo sua ruína”.  Conclui o pensador germânico dizendo que “a grande atitude desses espíritos doentes (...) faz efeito sobre a grande massa – os fanáticos são pitorescos, a humanidade prefere ver gestos a ouvir razões...”.

Trocando em miúdos, o seguidor é um desmiolado, um ser que é não dotado de vontade própria, pois o seu condicionamento patológico para ver as coisas o faz fanático. Já dizia Ariano Suassuna, “o fanatismo e a inteligência não moram na mesma casa”.