
O meu velho pai que, se vivo fosse, estaria com 91 anos, era um sábio, mesmo só tendo estudado até o 9º ano do ensino fundamental. Lia muito jornais e revistas e alguns livros. Estava atualizado sobre o que ocorria no Brasil e no mundo e, sempre que podia, dizia: “Sérgio, se você tiver tempo para ler dez livros, leia cinco que digam uma coisa e cinco que façam outra abordagem. Não vá cegamente no caminho trilhado por ninguém, Saiba escolher o seu caminho.”
Vendo hoje intelectuais que vomitam conhecimento sem fazerem as leituras necessárias, intelectuais que vivem com livros embaixo do braço sem que os leiam, intelectuais que opinam sobre o que desconhecem, olho para trás e constato que o meu pai tinha/tem razão.
Dizia ele o que propôs Henri-Maria Beyle, que a história conhece por Stendhal, escritor francês que viveu entre a segunda metade do século XVIII e a primeira do século XIX e que era um profundo conhecedor da existência humana.
Com seu estilo enxuto, Stendhal criou personagens que se notabilizaram pela sofisticada embora seca exposição dos mais variados sentimentos humanos.
Para Stendhal, os livros eram vistos pela Igreja Católica como inimigos a ser combatidos, logo proibidos. A Igreja sabia que o foco de qualquer subversão da ordem estabelecida estava na palavra impressa, pois ela se propaga no tempo, influenciando gerações.
Por aqui, abaixo dos trópicos, faço coro: quem pode criar problemas, meus dois ou três leitores, são os livros. Leia-os – sempre e muitos e, de preferência, os que abordem os temas sob ângulos diferentes daqueles que você ouve falar nas escolas, nas universidades e na mídia.
Os livros são perigosos, sim, porque são o passaporte para autonomia intelectual.
Neles podemos saber de coisas que professores não contam e podemos aprender a pensar por conta própria, sem aceitar apenas o que nos é contado em salas de aula e nas páginas de jornais e revistas.
Os livros abrem espaço para que possamos discordar de quem se apresenta como dono do conhecimento, rompendo os grilhões da dependência intelectual.
Para quem quer conduzir gado para o abate ideológico não pode haver subversivo mais perigoso do que um indivíduo que, mais do que andar com livro na mão, é dado a lê-los, pois é a partir deles, dos livros, que se forma o alicerce sobre o qual se ergue solidamente uma opinião pública madura e consciente.
Ninguém se põe abertamente, como adversário dos livros, mas não duvide que não são poucos os que se beneficiam do fato de que a leitura desperta pouco interesse no seio da população brasileira.
Quanto menos se lê e quanto menor for a variedade da leitura e as abordagens presentes no material disponível para leitura, menos ideias estarão em circulação e portanto menor será o espaço para discordâncias.
Professores, jornalistas, políticos, etc sabem que quanto menos lida for a população e quanto menos diversificada for a leitura feita, mais fácil é conduzir as pessoas para a construção de projetos utopicamente regressistas, de qualquer base ideológica.
Leiam livros para não serem seduzidos a derrubar estátuas por falsos iconoclastas que pouco leem ou que leem mal.