
Por Sérgio Trindade
Decorridas quase 72h desde que Tiü França explodiu-se na Praça dos Três Poderes, em Brasília, já é possível culpar os críticos dos disparates do STF pelo ocorrido?
Colhi as pérolas abaixo no Twitter(X), muitas ditas por anônimos; algumas por autoridades:
“Medida prudencial da população em Brasília agora é: ‘Acompanhe a agenda do governador, quando ele viajar não saia de casa. É fatal: ele saiu, acontece um atentado... Curioso né?’”.
“E a fakeada?”.
“Adélio Bispo foi preparado em acampamentos pra atacar Bolsonaro”.
“Adélio Bispo foi um lobo solitário. O terrorista que atacou o STF não é um lobo solitário. Ele faz parte de uma organização maior”.
Nada disso aí acima deveria ser levado a sério, mas é. Um monte de gente comenta, concordando ou discordando. Dependendo de quem o disse seria imediatamente apontado como fake news, mas a turma que profere tais coisas segue impávida dizendo o que quer e fazendo seguidores.
Quando ainda nem haviam sido iniciadas as investigações sobre o ato/protesto do maluquete de Santa Catarina, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) desandaram a dar declarações definitivas sobre o assunto.
Um dos primeiros foi Barroso, presidente da Corte. E para dar ares de seriedade à sua manifestação política, o ministro Barroso, em entrevista, tentou penetrar na alma do brasileiro: “Onde foi que nós nos perdemos nesse mundo de ódio, intolerância e golpismo? Por que subitamente se extraiu o pior das pessoas? (...) O que nós precisamos é fazer o caminho de volta à civilidade e ao respeito mútuo. Superar essa crença primitiva de que quem pensa diferente de mim só pode ser um cretino completo”.
Se o presidente do STF consultasse, por alto, os livros que tratam da história do país do qual ele preside um dos poderes, saberia que o ódio e a intolerância sempre conviveram coladinhas ao amor e à intolerância. Em episódios de nosso passado – de Palmares a Canudos, da Conjuração Mineira à Revolta Federalista, da Confederação do Equador à Revolução Constitucionalista de 1932, da ditadura varguista à ditadura civil-militar – são abundantes assassinatos em massa, degolas, enforcamentos, etc. Quase nada foi feito, nos momentos de grave crise, só com amor ou só com ódio, mas com os dois polos se batendo.
Aparentando preocupação com a democracia, Gilmar Mendes, também ministro do STF, registrou: "O ocorrido na noite de ontem não é um fato isolado (...). O discurso de ódio, o fanatismo político e a indústria da desinformação foram largamente estimulados no governo anterior. (...) As investidas contra a democracia têm ocorrido explicitamente à luz do dia, sem cerimônia nem pudor”.
O sábio ministro-político esquece que a democracia brasileira foi, na Nova República, corrompida para José Sarney ter direito aos cinco anos de mandato, para Fernando Collor tentar barrar o impeachment, para Fernando Henrique ganhar a chance de ser candidato à reeleição, para Lula aprovar, no primeiro mandato, sua plataforma de governo, para Dilma Rousseff quebrar a economia nacional, para Michel Temer escapar de um processo de impeachment, para Jair Bolsonaro governar sem que o Congresso Nacional lhe importunasse... A lista é longa e exigiria um tratado.
Mesmo que o maluco Tiü França, o homem bomba brazuca (somos muito ruins de fazer aqui o que se faz com muita competência lá fora), carregasse artefatos C4, sua ação estaria longe de pôr em risco o Estado de direito no Brasil, pois dificilmente haveria consequência disruptiva para a democracia do seu ato desvairado. Parece mais um ato/protesto insano que acabou em suicídio, gestado em ambiente socialmente desequilibrado, em virtude da forte polarização política. Outros atos/protestos semelhantes podem ocorrer. Só o esforço constante e regular no sentido de promover e garantir a pacificação atenuará o clima de radicalização política. Por isso, ela deveria ser a prioridade dos líderes de todas as correntes. Entretanto, alguns dos principais espaços estão ocupados, no governo e na oposição, por demagogos-populistas que sobrevivem da polarização.
Nos espaços que tenho e por onde ando continuo criticando o STF e o radicalismo político. Aqui o espaço é largo e se organizar direitinho, dá para falar mal de tudo que considero errado.
Parafraseando expressão que ficou famosa: eu não tenho erro de estimação.