Brasileiro abre pizzaria e hamburgueria na Irlanda e fatura R$ 9 milhões

24 de Setembro 2021 - 03h10
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O complexo de vira-lata, expressão e conceito criado pelo escritor Nelson Rodrigues, passa longe de Francisco Adamo de Oliveira Osório, de 35 anos. O empreendedor, que nasceu em Guarulhos (SP) e morou boa parte da vida no bairro paulistano da Mooca, está há cinco anos na Irlanda e tem se inspirado no Brasil para criar negócios gastronômicos do outro lado do Atlântico.

Junto de dois sócios, ele montou a 4Friends Burger, em junho de 2020, e a 4F Pizzeria, cuja estreia aconteceu em maio deste ano e trouxe uma novidade importada do Brasil: o rodízio de pizzas. Mesmo em pouco tempo de operação, a boa aceitação aparece na mídia gringa — a hamburgueria foi parar na lista das cinco melhores de Dublin publicada pelo portal Love Dublin — e nos números.

Da chapa da hamburgueria saem, por mês, até 8 mil sanduíches. Os lanches vão para a mesa do salão e entram nos carros dos entregadores para serem encaminhados aos clientes.

A pizzaria funciona no mesmo espaço físico, no centro da capital, mas conta com uma loja virtual própria nos aplicativos de delivery. A cada 30 dias, a equipe serve 6 mil discos.

Considerando os últimos doze meses, o grupo chamado de 4F faturou 1,5 milhão de euros.

Entre o cuidado e a fartura

Com 200 gramas de carne e pão de mais de 11 centímetros de diâmetro, os hambúrgueres chamam a atenção da capital irlandesa pelo tamanho.

Outro ponto de destaque, segundo Francisco, é o blend da casa. Inspirado em hamburguerias do Brasil, é composto de dois cortes bovinos e apresenta 25% de gordura.

Pelo que pesquisamos, aqui não é comum ter tanta gordura. É isso que dá suculência e deixa a carne macia"

Complementos, como a cebola caramelizada, a maionese e a geleia de bacon, são todos feitos in loco. "Assim conseguimos deixar do nosso jeito".

O verdadeiro cartão de visitas, no entanto, é o Camembert empanado. Embora o ingrediente seja francês, a ideia de colocar o preparo entre duas fatias de pão foi importada do país tropical. No melhor estilo porn food, o queijo derrete, rende boas fotos e lambuza os clientes.

Na pizzaria, a combinação de sucesso foi juntar a receita de uma massa levinha, que fermenta de 24 a 48 horas, ao molho de tomates de verdade e às coberturas fartas.

Os sabores são os favoritos dos brasileiros, como portuguesa e frango com catupiry.

A massa da pizza é italiana, mas os gringos têm dificuldade de aceitar a cobertura caprichada. Para eles, é muito recheio".

Irlanda brasileira

Enquanto a hamburgueria tem o público geral como alvo, a pizzaria quer fisgar o coração da comunidade brasileira, que é de 15.800 pessoas considerando toda a Irlanda, de acordo com o censo de 2016.

Para agradar aos clientes, a porção de coxinhas surgiu como opção de petisco ao lado dos dadinhos de tapioca, criação de Rodrigo Oliveira, do Mocotó (Vila Medeiros, São Paulos) que é replicada no Brasil e no mundo.

Fora do cardápio, a proposta também fica clara no Instagram da pizzaria, onde toda a comunicação é feita em português. No salão, há o menu impresso em inglês para os irlandeses e os demais estrangeiros, que representam cerca de 5% dos fregueses.

"A maioria dos brasileiros daqui frequenta um comércio de outro brasileiro toda semana. É muito normal. Tanto porque dá saudade das comidas quanto porque existe um senso de comunidade. A gente se ajuda".

Rodízio em galera

Francisco e os sócios decidiram apostar no rodízio de pizzas — tradicional no Brasil, mas uma novidade em terras irlandesas — como uma opção além do à la carte. O serviço só seria lançado quando a brigada recebesse os fornos a gás do Brasil, mas a largada foi queimada.

Para incentivar a reunião de grupos maiores de pessoas e encher o salão, a equipe decidiu estrear o sistema em dias especiais. "A ideia era servir o rodízio para quem quisesse fazer aniversário acima de 15 pessoas".

Desde que lançaram o esquema, porém, acontece rodízio todos os fins de semana. "Sempre fazem evento. O pessoal gosta muito. Em breve vamos estabelecer dias fixos".

O público prova todas as pizzas disponíveis, além de alguns sabores criados na hora por Francisco, e tem direito de comer entradinhas e sobremesas por 21,90 euros — convertendo, R$ 135,70.

Sem saber falar inglês nem cozinhar

O próximo objetivo do grupo é estruturar a empresa para lançar um braço dedicado às esfihas abertas e abrir novas unidades das marcas existentes em outros pontos da cidade.

Quem vê o negócio de Francisco decolar, porém, não imagina que ele chegou ao país em 2016 sem falar inglês nem cozinhar.

Desiludidos com as perspectivas em São Paulo, ele e a mulher, Niccole Benzoni, venderam o que tinham e juntaram dinheiro para embarcar na empreitada internacional. "Meu frila na época era fazer uber. Pegava o carro da minha esposa e rodava até de madrugada".

Eles contrataram a assessoria de uma agência e chegaram em Dublin com o curso de inglês esquematizado. Sempre de olho em oportunidades de negócios, Francisco vislumbrava ser um ponto de apoio da empresa brasileira na Irlanda.

Deu certo: alugou uma casa para receber novos alunos e passou a oferecer walking tour e serviço de transfer para ir e voltar do aeroporto.

"Chegou um momento que percebi que estava totalmente dependente da agência. Se acontecesse algo, ia ficar sem trabalho".

Com essa preocupação em mente, Francisco deu entrada na cidadania europeia e começou a pesquisar em quais ramos poderia empreender. Logo notou que na cidade não havia esfihas abertas como no Brasil e resolveu testar receitas.

Meus professores foram o Google e o YouTube".

Quando chegou ao resultado que procurava, achou um ponto, um sócio e colocou a Sampa Food para funcionar. "Postei nas redes sociais dos grupos de brasileiros no Facebook. A partir daí, não parou mais. Recebíamos pedidos pelo WhatsApp e trabalhávamos com delivery e take away".

Por desentendimentos com o parceiro de negócios, porém, o empreendimento, que operou por três anos e era tido como a primeira esfiharia de Dublin, fechou as portas. "Não me arrependo de nada. O Sampa Food foi como uma escola. Aprendi muito".

Olhando para trás e para a história que construiu na Irlanda junto de Niccole e do filho Matteo, de 3 anos, Francisco diz que ainda não é hora de voltar para o Brasil. "Não vou dizer nunca, mas no momento eu penso em expandir aqui. Quero que a 4Friends seja reconhecida no país".

Para se sair bem na missão, o empreendedor decidiu retomar as aulas de inglês. "Agora, busco o inglês de negócios. Tenho dificuldade até hoje. Me virei do jeito que dava".

Isso mostra que qualquer pessoa consegue fazer o que quer com as ferramentas que tem".

Fonte: UOL